Embarcando na Primeira Estação

O ponto de partida é Bahnhof#0; aperte os botões corretos e boa jornada pelo tempo.

quarta-feira, março 31, 2010

Bahnhof#30 - Caminhando pelas cores do arco-íris

de: 1994
para: 2005

Fui parar em beira de estrada no norte do Brasil.

A estrada não é muito diferente do acostamento. Terra batida, asfalto velho e de baixa qualidade, buracos, mato. Precária como a vida da maioria dos seringueiros da região do Pará.

Os meus dois novos companheiros de viagem me acompanham ainda assustados e fluorescentes. Acho que preciso dar um nome para eles, pois parece que não me abandonarão tão cedo. Questão de sobrevivencia ou de ser o próximo prato da refeição.

Nem estou ligando se ficarei radioativo com essa possibilidade.

As vezes essas coisas não interessam.

Tanto planejamento, tanta meticulosidade em apreciar a vida, pode ser frustrante ou ir por água abaixo por interferências externas. Que diga o Prof. Manrat. Por onde andará meu mestre ?

Uma senhora de cabelos brancos aparece há 50 metros de distancia.
Leve, simples, linda, sorridente.
Na mão um livro de capa dura.

Uma bíblia. A sua eterna arma.

Dorothy Stang caminha de encontro à vida, desde pequena, e de encontro ao destino, desde agora.

Me assustei com os 7 tiros, como os pecados capitais me assustam e me seduzem.

Sete são as cores do arco-iris.

Dorothy estendeu para os assassinos a bíblia, como sua vida estendida para os conflitos do Pará. Sempre o Pará. Que estigma desse estado !!! O povo paraense não merece isso. Ou merece ? Não quero nem saber.

Ela cai sobre o chão bruto.

Vou pegar um pouco de comida, antes que sobre mais algum tiro para mim.
Recolho os dois estorvos.

Antes de partir reparo que um dos matadores ri.
Do que ? Da vida ?
Insensato...

segunda-feira, março 29, 2010

Bahnhof#29 - O Campeão

de: 1911
para: 1994

Avancei um pouco para acalmar meus 2 companheiros radioativos.

Fui parar em uma estrada esquisita.
Na verdade, parece uma pista de corrida pois automóveis pilotados por homens vestidos em macacões coloridos, passam em alta velocidade.
Parecem brincar com o carro e com a vida.

Ficam dando volta sem parar, como se corressem contra o tempo e contra adversários inventados.

Pela placas de propaganda, estamos em Ímola, na Italia.

Um rapaz brasileiro, de nome Ayrton Senna, corre a uma velocidade impensada pelo Prof. Manrat.

A curva de Tamburello aparece e o carro dele, mais parecendo uma bala de canhão, mais fina que o normal, sai pela tangencia e bate de frente com a proteção que não protege nada.

Corro ao seu encontro.
O sangue começa a molhar o chão.
Não há mais vida.
Foi-se.
Procuro pelos dois pupilos.
Olham-me ainda com pavor.
Resolvemos ir embora, sem comer, sem dizer uma palavra sequer, total silêncio, em homenagem ao grande campeão.

Bahnhof#28 - Sem sair do lugar

de: 1911
para: 1911

Parece que não consigo sair do lugar.

Pensei que a bateria da máquina temporal havia se esgotado, mas me lembro que o Prof. Manrat disse certa vez que a carga é feita a cada viagem realizada.

Outra possibilidade: alguma peça solta e a máquina ficaria presa nessa data. Até que não seria mal. Saí de um laboratório para cair em outro. Mas não é essa a intenção da minha vida.

Preciso conhecer outros lugares, outras pessoas.
Foi quando escutei um barulho suspeito atrás da minha poltrona de acesso.

Percebi que 3 pequenos roedores de luzes fluorescentes e olhos cada um de uma cor, escondiam-se dentro da máquina. Com certeza radioativos pelas experiencias de Marie Curie.

O peso excessivo faz com que a máquina não saia do lugar e permaneçamos no tempo.

Não hesitei.
Escolhi o mais gordinho e comi.
Matei a fome e diminui o peso excessivo.
Os outros dois ficaram me olhando com medo.
Na verdade, com pavor.

Melhor assim.

Mas vou levá-los juntos.
Serão meus companheiros de viagem.
E se der fome...

Bahnhof#27 - A premiada

de: 2010
para: 1911

Procuro em vão pelo Prof Manrat.
Atrevo a máquina temporal por entre diversos laboratórios.

Vou pelo cheiro, pelo anseio, pela necessidade de ver meu criador.
Sem sucesso.

Agora parei no laboratório dessa moça.
Parece capaz.

Altamente eficaz.

A polonesa deixou o avental de lado e está se arrumando para receber um premio. Pelo que diz o jornal em cima da bancada, é o segundo Premio Nobel que ela recebe.

Agora como Química, pela descoberta dos elementos químicos do Rádio e Polônio.

O anterior, oito anos atrás, de Física, foi pelas investigações sobre fenômenos de radiação.

Pelo menos vou sair daqui irradiado pela beleza intelectual da mulher.
Não vou comer nada por aqui, pois tenho medo de estar infectado pela radiação da Marie Curie, que ficará para a história.

quinta-feira, março 04, 2010

Bahnhof#26 - Uma anja

de: 1723
para: 2010

Resolvi voltar para o local do terremoto do Haiti, segundos antes do fatal acontecimento.

Não é para sofrer. É para tentar antever uma catástrofe que muda a vida de todos os envolvidos.

Estou dentro de uma igreja.

Cerca de 100 pessoas escutam atentamente a palestrante. Elas tem esperança nos olhos.

A palestrante, uma senhora com voz calma, sorriso abundante no rosto, olha todos e presta atenção à vida deles como se cada um fosse único.

A médica passa através de seus encontros, conversas, as ações necessárias para que tenhamos um mundo melhor.

O terremoto começa, os gritos, os passos desesperados procurando as portas, o destino, o fim. Sob os escombros da igreja, Zilda Arns deixa esse mundo repleto de realizações e caminhos a serem traçados pela humanidade.

A Pastoral da Criança, entidade ligada à Igreja Católica no Brasil está orfã.

Escapei por pouco das ruínas. A fome avança, mas vou procurar comida em outro lugar. Não ouso tirar dos sobreviventes.

Bahnhof#25 - As estações

de: 1869
para: 1723

É confortante voltar um pouco mais ao passado.

Principalmente quando posso passear pelos esgotos abertos ao céus da cidade de Veneza. O lixo se acumula a cada dez metros. Cada habitante precisa compartilhar seu espaço com centenas de ratos.

Aqui sou mais um, misturado a essa multidão de peçonhentos famintos.

Estou à procura do padre.
Adoro-o, apesar de não ser muito simpático a esse grupo de religiosos. Salvam-se poucos...
Esse além da sensatez, possui a veia artística a flor da pele.
Suas melodias seduzem minha alma, como se fosse um encantador de seres e de senhos.

Vivaldi está se apresentando na instituição Pietá.

O Opus 8 arrebata os ouvidos e o poder de escutar o ritmo do ano dividido em nítidas estações. Todas as quatro, bandeiradas com marcações e sensualidade.

Ficará para sempre.
Ficarei mais um pouco.
Para ouvir as marés dos magistrais violinos levando as gôndolas ao longo do ano pelos canais de Veneza.

Bahnhof#24 - A grande alma

de: 2010
para: 1869

Sempre volto ao passado, talvez tentando resgatar o meu próprio.

Compartilho a saudade do professor Manrat e de minha companheira, com meus anseios solitários ao lado dessa máquina temporal.

Desembarco na Índia.
É a primeira vez que venho para cá.

As religiões tendem a ser de difícil compreensão para espantar a alma do humilde da bondade divina. Deus é muito simples. O amor é singelo. Eu sou uma cobaia e pronto. Quero viver, respirar, não prejudicar o meu redor. Se tudo fosse candido assim...

A teologia hindu, complexa como a maioria das religiões milenares, concentra Deus em 3 formas distintas: a criadora (Brahma), a destruidora (Shiva) e a equilibradora (Vishnu).

Quando o mundo está intranquilo, confuso, beirando o caos, Deus envia à Terra Vishnu na forma humana para que possa ser feita a reconciliação da humanidade.

Preciso me equilibrar, me reconciliar para viver em paz.

Nesse quarto na cidade de Porbandar, a criança que nasceu ontem, parece descansar. Serena, tranquila, como deverão ser seus dias entre os hundus.

Deram-lhe o nome de Mohandas.
O povo o chamará de Mahatma.
Na verdade, Ghandi não apreciará muito o título, mas devotará sua vida pela independencia da Índia perante a Inglaterra (sempre eles...) e encaminhará seu país na rota politica e religiosa em harmonia perfeita com as tradições do povo.

Com certeza terá sucesso arrebatador.
Isso poderá até lhe causar problemas.
Não sei ainda do futuro que lhe reserva.
Com certeza, o menino não se interessa pelo destino, mas pelo caminho.

Que a paz desse quarto venha a se expandir ao ocidente, aos olhos dos que procuram a tranquilidade de viver entre irmãos. Como ele dirá um dia, "a alegria está na luta, na tentativa, no sofrimento envolvido e não propriamente na vitória conquistada."

Paz a todos.






quarta-feira, fevereiro 10, 2010

Bahnhof#23 - Biscoitos

de: ano zero
para: 2010

Resolvi viajar para frente, esquecer o passado um pouco, inspirado pela criança sob a estrela guia.

Caí na América Central.
Um país devastado por poeira, choro e confusão.

Os tremores foram sentidos por toda a ilha e o Haiti ficou mais pobre.

Ao meu lado, uma mulher negra, roupa surrada e olhos cheios de lágrima, trabalha em silêncio, montando biscoitos de trigo, suor, barro e esperança.

Não tem ninguém para alimentar.
Apenas faz os biscoitos circulares.

Eles irão cozinhar sob o sol do Caribe.
Para os sobreviventes do terremoto.
Para os haitianos, sobreviventes desse planeta.

quinta-feira, dezembro 24, 2009

Bahnhof#22 - A manjedoura

de: 2009
para: ano zero

A noite estava estrelada.
Manto escuro de infinitos pontos cobriam nossos olhos.

Perto de mim, um estábulo, alguns bichos soltos, o casal.

A mulher, grávida, fechava os olhos numa mistura de preocupação e fé. Mãe e trindade.
Afinal, o poderoso fez nela maravilhas.

Me aproximei, sem chamar atenção dos animais para assistir ao espetáculo natural da vida.
E o menino nasceu.

Para a alegria do mundo, dos pais, dos céus, dos animais, das mulheres, das prostitutas, dos cobradores de aluguel e até dos fariseus e saduceus.

Quando parti, uma estrela guia tomava o céu iluminando os novos caminhos dos seres desse planeta.
Que todos tenha vida, vida em abundância.

quarta-feira, dezembro 09, 2009

Bahnhof#21 - A Cabana

de: outro lugar
para: 2009

A neve, fresca sobre as folhas ainda verdes dos pinheiros, lembra cobertura de chantilly insólita na floresta densa.

Faz frio, muito frio, mas suportável, como tem sido os dias.
Tente achar uma noz, um pedaço de comida abandonada, qualquer coisa que venha a satisfazer o vazio do meu estômago e por conseguinte, o hiato do meu ser abandonado.

Os humanos, pelo menos alguns deles, dizem acreditar em uma entidade superior que os protege, ampara, dá esperança, cria situações de luz, de flores em pleno inverno da alma.

Sou cobaia. Nada creio de espírito. Vivo. Apenas vivo.

A cabana está abandonada, velha, largada no meio das altas árvores que parecem tocar a origem do frio que cobre meu pêlo.

Não ouso entrar. Sabe-se lá quais são as armadilhas que esperam o visitante.

A menina surgiu na varanda, olhou para o infinito, pareceu sorrir para mim. Posso ver o broche delicado da joaninha no vestidinho vermelho e o nome na fina pulseira dourada: Missy.
Ela olha pela porta entreaberta e finge ouvir alguém que a chama para dentro da morada.

Não consigo ver ninguém, além dela.
A menina entra saltitandom, retorna para o calor dos braços de alguém.

Kiss me.
Tente me beijar, medo.
Tente me alcançar.
Estou indo.

segunda-feira, novembro 30, 2009

Bahnhof#20 - Ainda atônito

de: qualquer lugar
para: outro lugar

Nem prestei atenção onde fui parar depois de tudo que me aconteceu.

Saí na esquina de uma rua movimentada com uma esquina mais movimentada ainda. Noite total, luzes, movimento de pessoas, diversão e trabalhadores.

Amparei-me na lateral metálica da banca de jornal.
Reparei nas manchetes do jornal fresquinhas.

Um título dava ênfase a nova lei no interior do estado onde os feirantes estão proibidos de gritar "madame, olha o peixe fresco, dez reais a manjuba."

A outra manchete, em cor vermelha, destacava o assassinato por faca de um estudante com menos de 17 anos na saída de uma boate. O que fazia um rapaz em plena semana de aula, saindo de uma boate de madrugada ? O que o teria levado a se envolver nessa briga armada ? Onde estão os pais desse rapaz ? Chorando agora ?

Lei para proibir o grito na rua e um jovem gritando por socorro sem ser escutado.
Esses seres humanos...

Vou ficar mais um pouco por aqui, respirar, fechar os olhos para me recuperar e sair na jornada do meu destino.

quinta-feira, novembro 19, 2009

Bahnhof#19 - O desespero

de: 1927
para: qualquer lugar

Sem rumo, entrei na máquina sentindo-me perturbado.

Nunca havia sido tocado pelas asas da morte de tão perto. Presenciei cenas infames de perdas de vida, mas sempre de humanos, seres estúpidos que habitam o planeta como se o mesmo tivesse sido feito exclusivamente para eles.

Agora, o pulso alado negro aterrisou, não ao meu lado, mas dentro de mim e levou a minha companheira. Sem negociar, sem conversa, implacável sedutora de seiva.

Não pude fazer nada. Mas estou sereno.
Deixei-a para ser consumida por outros seres da cadeia biológica.

A companhia dela me satisfazia, percorríamos lugares em busca de novas descobertas.

Preciso refazer o meu caminho. Tentar encontrar o Prof Manrat.
Tentar encontrar o sentido da vida.

Botões vermelho, branco e azul.

Bahnhof#18 - Sem reação

de: 340 a.c.
para: 1927
Minha companheira continua muito mal e febril.
Saí da Grécia em direção a tempos mais modernos, com a esperança de que consiga uma medicação para melhorar o estado de saúde dela.
Tive receio em voltar para o laboratório do Prof. Manrat e encontrar mais destroços causado pela guerra entre os homens. Ou seria receio de topar com o próprio professor ? Não sei o que ele faria comigo, ainda mais depois que furtei deliberadamente a máquina dos sonhos da vida dele.
Mas fui parar em outro laboratório, do Dr. Fleming.
Ele parece envolvido com algumas experiencias mas parece meio distraído. Deixou uma amostra de bactérias destampada. Desse jeito elas serão contaminadas pelos microorganismos que estão no ar. Todo mundo sabe que isso vai dar fungo...
Acho que ele não vai resolver o meu problema.
Vou procurar outro cientista mais capaz.
Ela não está reagindo. Preciso sair daqui.

segunda-feira, novembro 09, 2009

Bahnhof#17 - As fases da lua

de: 1967
para: 340 a.C.
Até agora não entendi o que aconteceu.

Programei a máquina temporal para uma data e vim parar em outra, muito mais distante do que estava planejando.

Devido ao salto muito largo de séculos, minha companheira de viagem está desmaiada, como se um eclipse passasse sobre ela por tempo indeterminado.

Voltei para a Grécia, muito calor, mesmo de noite.

Um senhor, meio parecido com o tal Pitágoras de jornadas anteriores, olha o céu apaixonadamente e rabisca algo sob a luz de velas.

Seriam escritos lógicos, metafísicos, morais, políticos, sobre física pura, éticos ou simples retórica de um filósofo e pensador grego ?

Aristóteles marca as fases da lua e determina com exatidão o fenômeno. Conclui que o satélite natural da Terra é um corpo celeste iluminado e não luminoso.

Desse jeito me apaixono pela lua também.

Minha companheira está com a respiração lenta.
Preciso cuidar dela, afinal "devemos tratar nossos amigos como desejamos que eles nos tratem."

Quantas precauções e preocupação para o sentido da vida.

Tenho dúvidas em ficar mais um pouco ou tentar sair desse calor.
Acho que tenho que arriscar. Nada na vida é exato. Nada é permanente.
A alegria pode ser uma fase. Nova ou cheia...

Botões em sequencia e vamos ver o que acontece.

quinta-feira, outubro 08, 2009

Bahnhof#16 - Recuerdo da Selva

de: 490 a.C.
para: 1967

Corríamos por entre as sombras das árvores da floresta tropical sem determinação de tempo. Comíamos o que aparecia. Plenas férias em terras bolivianas.

Avistamos um casebre sem porta, sem janelas.

Dentro, um homem cansado, de barba, estava só, mas parecia abandonado. Pela sorte, pela vida, pelos companheiros de luta, pelos sobreviventes da liberdade. O esforçado sorriso que soltou parecia que aguardava-nos para uma última conversa.

- Não há fronteiras nesta luta de morte, nem vamos permanecer indiferentes perante o que aconteça em qualquer parte do mundo. A vitória nossa ou a derrota de qualquer nação do mundo, é a derrota de todos...

Paramos e ficamos escutando-o contar suas aventuras. A impressão que tínhamos é que ele também possuia um máquina temporal pois nascera na Argentina, subira de moto toda a América Latina, atravessou o golfo do México para aprender a fazer revolução em Cuba ao lado de Fidel Castro e agora estava abandonado ao acaso em plena selva.

Parecia calmo e ciente do que estava para acontecer.

Passos fora da casa e homens de farda, de língua estrangeira, o executaram covardemente. Como se ele pudesse se defender de algo. Defendeu a luta por momentos melhores. Lembrei daquela rainha e sua guilhotina. Como os seres humanos se auto-executam sem hesitar. Muito irracional para o meu pequeno cérebro de cobaia.

Ficamos ao lado do corpo por muito tempo. Chegamos a acompanhá-lo no helicóptero até um hospital para ser feito a autópsia. Uns oficiais americanos culpavam os militares bolivianos do assassinato e vice-versa. Vimos tudo. Fomos testemunhas. Na confusão antes de cremarem o corpo do morto para que não virasse culto de peregrinação por fanáticos no futuro, mordi o dedo direito de Ernesto e guardo os ossinhos até hoje na máquina temporal.

Minha companheira assistiu a tudo e tremendo exclamou:

- Se somos capazez de tremer de indignação a cada vez que se comete uma injustiça no mundo, então somos companheiros.

Botões em sequência e partimos. Tristes.

Bahnhof#15 - Escola de Pensamentos

de: 1793
para: 490 aC

Nunca tinha voltado para o calendário antes de Cristo. Arrisquei procurando um momento de sossego, acreditando que antigamente o planeta Terra fosse menos agitado.

Chegamos na Grécia sob um calor insuportável e imediatamente procuramos uma sombra para o descanso e lanche.

- Voce está bem ?
- Estou.

Ouvir a voz, mesmo que baixa, da minha companheira de viagem foi um presente.

Enquanto comíamos despreocupados, escutamos vozes de um grupo de pessoas, adultos e jovens, que pareciam discutir algumas idéias interessante. Falavam que todas as coisas eram foramdas por quatro elementos (terra, água, ar e fogo) e que o elo entre esses elementos era o número. Pareciam matemáticos e sábios.

Ao centro do grupo, um senhor de estatura mediana, quase calvo, observava todos com um semblante tranquilo e rabiscava com uma longa vareta no chão o desenho de um pentagrama.

- Se eu utilizar a ração áurea dessa figura e projetar sobre as cordas esticadas feitas de crinas dos cavalos, conseguirei uma escala de 7 notas e posso construir o instrumento musical que quiser.

Um menino que o olhava com admiração passou a desenhar um triangulo ao lado do pentagrama do mestre e questionou qual era a relação dos lados daquela forma geométrica, quando um dos angulos era um angulo reto.

O mestre rabiscou a equação entre as duas figuras no chão e todos contemplaram aquele momento de sabedoria. O teorema de Pitágoras foi de suma importância para a definição da matemática como ciência da humanidade.

O mesmo menino nos observou e antes que fugissemos apavorados, trouxe-nos um pote de água. Sob o calor do Mediterrâneo, aquele grupo foi uma das melhores passagens que tivemos em nossa escala de aventuras.

- Para onde vamos ? ela me perguntou.

Fiquei quieto por alguns instantes, encostei meu corpo ao dela e permanecemos ali mais alguns dias.

Bahnhof#14 - A velocidade da lâmina

de: dezembro 1941

para: 1793

Mudar não significa apenas fazer o que o outro fazia, mas fazer de forma diferente, convincente, nem sempre mais prática, nem sempre mais ampla. Mas precisamos mudar sempre. Faz parte da natureza animal.


Revolver é perseverar nessa mudança todo dia. Cada vez que salto no tempo, tento aprender, compreender os movimentos instantâneos que ocorrem. Tento me adaptar às revoluções de cada momento histórico.

A cena daquela mulher subindo os degraus e ajoelhando de maneira singela sob a grande trave de madeira é algo que eu e minha companheira não esqueceremos jamais. Os comentários dos que assistiram a cena conosco é de que ela e sua família eram extremamente injustos com os trabalhadores. Uma mulher tão bem vestida... Parece-me que muita coisa não mudou desde então. A tal Revolução Francesa trouxe muitos benefícios democráticos a quem ? Aos novos que assumiram o poder ?

Não ficou muito claro para nós toda aquela balburdia e como reles cobaias entre tantas ratazanas parisienses, vasculhamos os porões do Palácio de Versalhes para encontrar queijos e conservas. Não nos interessava a tranquilidade dos sonos dos justos.


A sensação inflamada pelos gritos e correrias de todos é que a partir daquele ato, a riqueza deslumbrante seria distribuida igualmente para todos.


Igualdade, fraternidade e liberdade.
Quase peguei um brioche para comer com o queijo, mas desisti.




Um dia, no meio de canhões em uma ilha paradisíaca e no dia seguinte, cabeças rolando no ritmo da guilhotina. Vamos procurar um lugar mais tranquilo para comer.


A minha companheira continua muda e assustada. Mas não está mais tão faminta.

segunda-feira, setembro 21, 2009

Bahnhof#13 - Sossego Paradisíaco

de: 1941
para: dezembro 1941

Não variei de ano com receio de acontecesse alguma coisa com ela.

Me desloquei até uma paradisíaca ilha do Pacífico para ficarmos tranquilos, sossegados, enquanto ela própria recupera a respiração e desenvolve confiança em mim, seu novo companheiro.

- Voce está bem ?

Exausta, nem responde. Me olha desanimada. Quando tento me afastar, ela me puxa lentamente ao seu encontro e fecha os olhos. Dúvida de deixar ir, querer ficar.

À sombra dos coqueiros o barulho do mar é agradável e com certeza o local escolhido foi excelente. O arquipélago havaiano é uma das mais belas obras da natureza desse planeta.

Ela agora descansa e vou procurar comida saindo um pouco da praia de Waikiki, uma das mais habitadas da ilha de Oahu. Poderia viver com ela aqui para sempre. Poderíamos mudar de praia quando nós... um zumbido sendo amplificado a partir de pontos no horizonte vindo em nossa direção... o que são essas máquinas voadoras ?

Meus pelos arrepiados lançam-me de volta ao encontro dela enquanto escuto barulhos ensurdecedores de explosões ao longe. Ela está acordada e assustada.

Vamos partir novamente, para outra data. Parece que os homens adoraram expandir a guerra além das fronteiras da compreensão racional.

O arquipélago irá para os ares e nós iremos embora antes que isso aconteça. Do jeito que os homens são, no futuro esse ataque irá se transformar em atração turística. Não duvido nem um pouco.

Sequencia de botões e partir mais uma vez.

quarta-feira, setembro 02, 2009

Bahnhof#12 - A Companheira

de: abril 1500
para: 1941

Não me acostumo com os largos saltos no tempo...

Mas não consigo me acostumar com a idéia de que não consigo encontrar o Prof. Manrat na própria terra dele.

A guerra continua e a confusão de braços, pernas, mutiladas, ensanguentadas, confunde cada vez mais a minha lógica animal de querer e poder encontrar meu cuidador.

O laboratório continua destroçado e acho que nunca mais ele retornou ao local.

Vejo no canto esquerdo um movimento.
Minúsculo, pendular.
Me aproximo e vejo um ser, parecido comigo, mas fêmea.
Assustada mas consolada em ver algo parecido com ela, ou seja, eu.

Não me recordo dessa criatura. Deve ter aparecido de fora ou é fruto das experiências do Prof. Manrat.

Está muda. E assustada.

Aproximo-me dela e nos encostamos. É bom sentir calor externo novamente. As mãos do professor sempre me faziam carinho antes e depois dos experimentos. Sinto falta dele.

Ficamos imóveis por diversos minutos, sentindo a pulsação, trocando calor, respiração, ofegantes entre os escombros humanos de um local abandonado. Ela estava só. Eu navego só.

Vou levá-la comigo.
Será que cabe na máquina ?
Não custa tentar.

- Voce quer vir ?
Ela veio. Vamos...

Bahnhof#11 - As virgens da praia

de: 1656
para: abril 1500

O balanço do mar deixa a maioria da tripulação enjoada e posso dizer que essa viagem não pode ser definida como um cruzeiro através do oceano Atlântico.

Dias sem ter o que fazer em busca de uma ilhota, de um horizonte diferente dessa quantidade absurda de água.

Estou dormindo desde ontem à noite no porão, com certo receio de virar comida dos marujos, mas com a curiosidade, que tantos gatos já matou, para ver o que acontece.

Tem um senhor escritor, que não pára de anotar as passagens da viagem e um outro, mais imponente, chamado de Capitão Cabral pelos outros, que não desiste de olhar para o infinito.

No meio da tarde seguinte, avistaram algumas gaivotas, um pedaço de terra, um monte que chamaram de Pascoal e praias lindas. Parece até um porto seguro.

Contornaram os arrecifes, desceram em botes e trocaram as primeiras experiências com os habitantes semi-nus daquela terra enorme. Parecem ser pessoas boas, inocentes, diria até pueris.

Acho que eles estão trocando papagaio por pardal e irão se arrepender, mas descobrir terras tem dessas coisas: quem vive na terra morre e o explorador, explora mesmo.

Vou correr um pouco pela praia e voltar para a nau antes que seja tarde demais para mim, afinal estou nú.

Prof. Manrat adoraria esse lugar diferente...